sábado, 5 de maio de 2012

Essências '

Embora se foi e eu deixei-a ir, quebrei as algemas, e me algemei em seu lugar, chorei lágrimas de perdas, pari pedras, meu sofrimento calado e solitário, quebrou as pedras e transformou em pó, meu espírito inquieto se tornou lento afumegar, e os olhos de quem partiu derreteu seu esplendor esverdeado, pelo líquido inebriante e falso da alegria. Volto ao lago onde lhe dei a vida, fico pasma! Pela imundice sombria, as águas calmas tornaram-se fúria, e o lago rejeitou sua adoção, desnudou sua alma, e a fez caminhar sobre terra seca pedregosa, sob sol escaldante, mas entre suas memórias revolvidas havia papéis sujos, e a saudades do sagrado e secreto coração, amante da alegria por ter vivido a verdade. Retira seu lenço do passado, e acena pela volta. Sabe que o caminhar a fará sangrar, mas prossegue, crédula e confiante, sente no rosto a brisa abençoada do aceitar, e junto com o vento é levado toda a fumaça torpe e mal cheirosa. A menina guerreira então, com seus pés plantados agora na terra da vida, usa as ferramentas da verdadeira emoção, para prazerosamente viver a vida que lhe foi presenteada para retomar seu lago puro... Por que sabe que alguém que lhe ama além do amor lhe espera, para juntas plantar essências e perfumar seu presente, e eu a deixei se aconchegar...

Dora Dorinha '

Andorinha... Andorinha, alce vôos, mostre para que veio minha Andorinha, oleira, arquiteta, trabalhe o barro, a argila, com o bico veloz. Bem sei do seu cansaço, nele escondes teu coração, mas se mostras feliz! És feliz! Construiu seu lar, com zelo absoluto cria seus filhotes com desvelo, lhes ensina a sabedoria, e o segredo de construir, entre as paredes do templo se sente graciosa, levanta a cabeça cheia de altivez, voa altaneira. O seu predador não lhe faz medo, sua casa está entre as paredes do templo, seu lar é seu reduto, lá você é sacerdotisa, com sabedoria sabe que seus dias são escassos, mesmo assim voa corajosa, voa como se fosse seu último bater de asas. Por um triz não toca a morada do seu Criador, fala com Ele, lhe agradece por ter sido ensinada, como construir seu habitat, com papéis de seda enfeita seus pátios, e ouve o Rei dizer-te:' Melhor um dia nos teus pátios, do que mil em outro lugar'. Vá Andorinha, labuta teus pátios até encontrares repouso, alça seu vôo para fugir do perigo, nunca da vida... Vai sim em busca da real liberdade, pega carona no vento, para se manteres viva, esperança são as suas asas, e assim agradece cada amanhecer, e eu mortal Dorinha, por que não vou voar como uma Andorinha, perder meus medos, e mudar meu planar, serei livre se não meu predador me tira o indescritível prazer de voar.

Simplesmente '

É noite e meus fantasmas antigos voltam em minha mente, mas agora muito nítidos tão transparentes e visíveis que quase posso toca-los. Cheiro doce como os afagos nunca esquecidos, apenas engavetados pelo amigo tempo, antes de se aproximar de mim meu olfato sente levemente o perfume adocicado que me faz estremecer de emoção, é meu afago. Está vestida de prata, seus cabelos curtos e negros, ah! Esse sorriso, como um colar de pérolas, conheci tantos e tantos, mas aquele era como neve, era inconfundivelmente familiar, com voz maternal me dizia: 'Saudades meu bem', e eu com olhinhos negros e empobrecidos pela falta de brincadeiras e afagos. Fecho e abro meus olhinhos, como um 'lequezinho' oriental, e relembro que antes da sua chegada me escondia atrás do meu balanço, para fugir do martírio de ser pequenina criança, na dormência da inocência tudo era fuga. Meu acordar, meu andar, meu ódio infantil, guardado na caixinha do meu frágil peito. O dia se vem e com ele a claridade, não posso mais chorar, me transformo numa criança velha, não deveria sentir os efeitos de amargo sentimento que esmaga meus sonhos. Ela foi meu refúgio toda uma vida meus fantasmas iam embora, e eu volto de velha a criança, ah! Com ela havia tapete mágico, e como puro encanto ela afagava e sarava minhas dores, sentada comigo na concha do seu colo. Seus dedos, transavam meus cabelos como uma artesã, ela era linda como a rainha da arábia, me banhava com amor, e eu pura e livre ainda sinto o cheirinho do floral sabonete, me colocava para dormir e lia histórias muitas histórias, e muitas histórias se passaram nas páginas da minha vida. Hoje meu copo transbordou, tive filhos e filhas, da qual levei-os a passear no meu antigo tapete voador, transei cabelos. Já ganhei presentes, viajei, desejei, tive tudo que amei, mais meu presente ainda é abraça-la, e tocar suas mãos mornas de amor, que tornaram feliz apenas uma fatia de uma infância infeliz, quando ela partia eu chorava, até meu coração secar. Os anos voaram e me tornei como sempre desejei, ser sua filha, mais o Criador lendo nas profundezas do meu ser me tornou "sua filha " espiritual, ainda troco um beijo por um longo abraço, continuo caminhando e sorrindo, às vezes chorando porque não... Para a mulher mais linda que conheci, minha simplesmente Maria.

Anjos '

Quão inutilmente tento retomar o caminho, me sinto só, perdida, não conheço meus pensamentos, me pego caçoando de mim mesma, faço perguntas e não tenho respostas, a preocupação me domina me torna rebelde. Como sou injusta, não vejo a luz meus pés me levam ainda nos lugares que vou adorar, que privilégio é cantar, sorrir, falar, será que os anjos sorriem e falam como eu? Fui presenteada com os atributos do amor, agora inverto os papéis, não tenho acesso:faço meus valores, pago meus votos, desejo viver, faço um pacto, quero resolver o litígio, procuro o judiciário, não tenho álibi, vou caminhando no sentido contrário do vento, meridional ou setentrional qual o ventos dos anjos? Paro diante das dunas macias e falsas, se continuar apática serei ceifada pela areia. O sol do meio-dia me castiga, me enegrece a pele, meus lábios secos sentem a maciez da água, mais valiosa do que o desejo de viver. Estou gemendo, me faço nua, não pago penhor, não tenho valor, apenas descobri a luz, os anjos riem, se alegram e até choram, me sinto humana, tão humana que tento tirar o melhor de mim dançando na areia sob o comando sinfônico dos ventos, mais meu corpo antes tão frio usufrui agora o calor do sol. Passei a me chamar vida, a luz acende o abajur dos meus pensamentos, agora conheço o fundo do meu olhar, tenho vida, vi os anjos, vou usa-la para aprender a falar como os anjos, a linguagem do amor.

Leite do Coração '

Peitos com leite, coração moído, dor gritante, emoções dilacerantes, sentimentos profundos poço sem fim, tribulação paralela, ora dor ou alegria. Ser mãe é um redemoinho de profundezas da qual não temos conhecimento, somos hábeis professoras de ter cada momento controlado, ilusório coração, somos enganadas e levadas pelo amor da manipulação, cada segundo pela magia de seu sorriso. Nós mães no momento do nascimento, desejamos não respirar mais tamanha dor, choramos com a alma, acreditando ser gotas de sangue, mas no êxtase do nosso choro ouvimos outro choro, e esquecemos instantaneamente que somos humanas, e nos segundos de piscar nossos olhos imperfeitos nos sentimos divinas, e envolvidas pela cena irreal e por aquele choro que encanta até a luz, sorrimos desejosas de tocar, afagar-lhe, e dar-lhe o leite do coração. Filhos presente perfeito advindo do Criador.

sexta-feira, 24 de fevereiro de 2012

Recusa '

Quem sou eu para escrever, ou colocar meu coração em palavras? Quem pode escolher ou representar palavras? Estou empanturrada de preocupação, e minhas emoções furtam minha paz, e me dão desassossego, meus caminhos aflitivos, meu dias doídos e loucos, estou sem luz, minha vida perece as carências, e se tornaram qual morada... Minha cama são espinheiros, minha confiança jaz num pequeno vaso de flores mortas, da qual as sementes  tornaram estéreis meus olhos áridos. As fontes de água que haviam em mim, evaporaram, me resta deitar nas cinzas, e me encobrir com o manto sujo e velado da fugaz existência minha... Isto é fato. 
Estou perplexa com essa visão medíocre e apodrecida da minha vida. Lentamente me desnudo do manto, me recuso a entrega, me decido pela luta, não me permito ser pó, embora seja mortal, como ervas amargas, fujo dos raios, me banho na neve, reconheço minhas fraquezas, falo palavras aladas que voam para me defender, levanto os ossos de minha cabeça como de realeza, coloco meus joelhos eretos, então desfilo, meus pés leves compassados com as batidas do meu peito. Arisco um sorriso, desloco meu ventre, e descubro que posso gargalhar, atravesso a cortina divisória da dor, para a derrubada de um dia ensolarado, dou a mão para quem amo, e num aperto quente vivo, estabeleço a duração da vida, nas mãos do Criador, pois quem sou eu para recusar.





Por : Dora Padã
Data:14/04/10

Choro e Chuva'

Até onde consigo chegar? A neve cai diante de mim, mas meu coração está congelado, tapo meus ouvidos, para que eu não ouça sentenças contra mim, Odeio vereditos... Suborno meus olhos para não velos infelizes, tento me esconder atrás da cortina da abstinência de reviver minhas carências. Meus olhos estão de vigília, lacro meus finos lábios sem cor, da qual meus sorriso escôo, dentro do meu trincado cântaro, estou frágil como um vidro invisível, então choro, choro de novo como em chuvadas de inverno, em Padã-Harã, faço meus olhos se transformarem em nuvens de aguaceiros, e minha fragilidade se levanta em um despertar, majestosa chuva, como filetes de cristais, que renovam o meu expirar, chuva que me recorda a terra, e que me faz semear a ceiva da vida, e sei que vai chover até que eu encontre o prazer de brotar, me tornar árvore, produzir flores, sentir o cheiro acre-doce, dos frutos amadurecidos... Pelo sol. Porque a chuva gentil deu lugar ao sol, permitindo reflorescer, deixando um rastro de renovação, onde tudo que quase foi decepado pela seca da minha ingratidão, brote jubilante, para alimentar mais vidas, o ramo novo e verde levou a fraude, dos meus olhos, dos meus pés, meus lábios são tocados pelo meu antigo sorriso, meus dedos ditam canções, meu coração grita como um a fonte de água, para meu corpo molhado poder dançar, a dança do sol, a dança da vida.




Por:Dora Padã
Data:10/11/08

Terra Viva'

Fragilidade é meu nome, sou criação da alegria, nasci onde a terra é roxa, e a flor do café tem perfume, meus banhos rosa de canela, minhas vestes saias de lírios, sou ébria dependente de minhas emoções, brindo a vida, meu viver, meus amigos, meu paraíso, e todos os sorrisos. Amanheço com os pássaros, aprendo com o seu zelo, e agradeço o bom dia da beleza que é viver, sinto o cheiro encantado verde da terra, minha saliva é mel do prazer, ao sentir o presente Divino, ao degustar o pão de cevada, o leite da vida, manjares e creme dos queijos. Só então nos damos conta de que estamos também desfrutando dos juros cobrados da vida, os sorrisos de quem amamos, e que tudo, por tudo que temos, vale a tentativa de lutar para viver. Levantamos da mesa rindo do nada; tempo que levamos para descobrir o êxtase que é estar vivo. 
No caminhar, nessa terra criada para abrigar vidas, feita como planeta azul mais perfeito, para dar emoções, riquezas no amor, e por que não chorar? Quando o coração é levado a transbordar pelo milagre elevado do parto, chamado vida. Minha terra me traz vida. 


Por: Dora Padã
Data:20/04/10

segunda-feira, 6 de fevereiro de 2012

A Tela '

Minha emoções são pincéis da qual pinto minhas paisagens, posso colorir minha pele opaca, retocar meu sorriso, usar a cor preferida da minha lembrança, ou perguntar as meninas dos meus olhos, quais as cores que tem minha íris, preciso pintar, redesenhar meu eu, ser feliz, me sentir perfeita diante do "Artista Maior", por isso me envolvo em cada cor, cada luz, cada toque de tinta para expressar, se meu toque é forte ou suave. Às vezes emanada de tingida pelo viver, eu estendo meus braços frágeis e leve, para tocar fora da Tela, e sinto o estonteante cheiro de tinta, como fragrância de madeira recém cortada, me vejo viva, viva para ver o lugar que almejo estar, quero pintar meus sonhos, o vento, o ar, o sol acariciando os rios, se possível até a melodia silenciosa que ele canta, ao tocar nas pedras. Parece impossível reproduzir tal som, como posso pintar o ar, o ofegar, assim como é impossível desejar, e não viver, como posso pintar sonhos? Sou real, sou realeza, às vezes viajo nas asas da esperança, mais como mendiga da vida, quando retorno sou rainha, então rasgo as Telas da minha vida, e os pincéis de espinho do meu padecer, flores aonde está esse seu perfume? Desejo e preciso sentir o cheiro no ar, dar vida em minhas Telas, minhas veias. Num manchar de tinta, me sinto pulsar, vaguear, olho ao redor, não estou mais presa na Tela... 
Estou viva... 
Estou voando... 
A tribulação se foi...O vermelho permaneceu, pelo cheiro não é tinta, é meu sangue, sangue me trazendo de volta a vida, toco na moldura dos meus ossos, os tons são claros, suaves pastéis, esguios são meus braços, minha paspatur, a pequena falsa moldura, a reconheço, finalmente meus pés tocam a terra firme e seca, posso caminhar, Que Saudades, molho o chão seco com minhas lágrimas felizes... E por um instante toco na Tela vazia em branco, vejo meu sonho de viver resgatado, pacto concluído, meu paladar saliva o desejo da gordura do trigo, me fartar do mel do meu quintal, subir na minha árvore... Vou abrir a boca e encher a terra com a minha própria voz, para que todos ouçam, que vivo por gratidão, gratidão que me ensinou a pintar minhas dores, na Tela da minha alma, e tingir de varias cores minhas dores, estendo meus dedos, e toco nos meus sonhos. 
Estou na Terra, não na Tela... 

01/01/2055.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Presente '

Tiro meu passado do rascunho, e traço o esboço do presente, passado irreal, vivido com lucidez louca, de sugar cada fio do tempo, como se a vida fosse embora, sem acenar-me, no instante que o tempo parasse, e me devorasse como se eu fosse nua de alma, e vazia de emoções, e não estivesse presente,  passado, oh! meu passado, forte e intenso, como o peso das águas, e me afogou em ondas pesadas e acortinadas de um mar invisível, do qual somente eu, eu me afogasse na doçura de momentos cristalizados pelo rascunho da felicidade... O passado levou meus planos, fogo, pensamentos de algo não realizado, e restou fiapos de saudades, meu abismo é meu presente, meu palácio, onde marés de águas empoladas escondem o naufrágio de minha derrota, oh! triste rascunho, agora  amarelados pelos dias e anos, selados nas páginas marcadas da minha vida sem vida, onde minha realidade me dá de presente a saudade de sorrir no presente.






Por:Dora Padã
Data:03/07/11

Moinho '

Saí do vendaval, e me tornei a 'Dama da Triste Figura', meu moinho de vento deixou de tocar, não recebe o vento machucando a água com seu bater condoído, não folga nas alegrias, e se debate na tristeza, o frio vindo do sul sacode seus ossos, e esse guizo fere os ouvidos das árvores, as flores se fecham com medo do olhar dolorido da 'Dama Triste', os rios choram e soluçam com a saudade incontida de que um dia a dama que foi radiante e que era elegante em seus gestos, exalavam o aroma de violetas, que visão triste, sentir e viver e não realizar. Na beira dos rios a orquestra dos insetos bateram em retirada, levando suas notas... Com Dó para alguém que mereça ouvi-las, os limos ficaram impregnados na madeira do carvalho, na espera de que um dia a dama matasse seu dragão, e liberta voltasse a cavalgar o seu negro cavalo, tão corajoso como a dama, e retornasse ao seu moinho de vento. Mas a dama terá de caminhar sobre pedras de fogo, e dar a luz sem dor... Mais no medo há a dor, que mata. Sinto o momento da luta, e o grande dragão volta, sinto seu ar quente sobre mim, volto ao princípio e exijo de mim a luta, visto minha armadura brilhante, em punho a lança, não me permitirei ser covarde, me dou a chance de vencer, o vento me favorece, me energiza, sou guerreira, cavalgo com obstinação e mato meu dragão, saio do vendaval, sou a 'Dama do Moinho'...




Por:Dora Padã
Data:11/01/11

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Mentiras '

Sinto cheiro de montanha com perfume de montana, no ar flutuam ananás e alfazemas, cheiro repousante da verdade, odor insuportável do mentir. Fui a Roma, odiei catedrais, amei palácios, e me senti soberana, em Paris amei a luz, odiei o gueto, e me vi sem luz, nas areias do deserto mergulhei no Nilo, odiei a Esfinge, mais amei Faraó, não fingi... Me batizei no Mar Morto, me senti viva, e sangrei, viajei, respeitei o tempo, o espaço, a vida me fez mentir para não sentir, sou insípita como os camarins, meus pensamentos insuportáveis estão em artes cênicas, pelo fragrante cheiro da verdade. A verdade corrói e fere, mas como bálsamo, cura, regenera, e volta a vida, nos faz voar com asas 'real' da paz. Voltar a Paris e sentir a luz, mergulhar no bem amar, e flutuar no tempo, e na volta merecer espaços, batizar a felicidade, se achegar, me perfumar, acreditar que o mentir é astúcia, e a verdade é indestrutível e penetrante luz. 
Fui a Paris?







Por:Dora Padã
Data:20/05/11

Árvore que Chora '

Desejei quase que opressivamente partir, me calei, travei, e acomodei, palavras que se tornam vivas, fortes ou fracas? Não soube fingir, me tornei passiva, deslocada e infeliz, vivo sonhos irreais, pesadelos reais, cicatrizes foram curadas com unguento da tristeza e adormecidas pelas promessas vazias, magoada e manchada como nodêna, não parti me escondi em um labirinto sombrio e úmido, de uma casa fantasmagórica, minha mente falha ela se perdeu nas correntes do meu fúnebre relógio, emudecendo o tic-tac do seu cantar. A dança perdeu a leveza meus pés estão dormentes, não acompanham minhas emoções, sou uma árvore que chora, plantada na terra árida da saudade dos meus velhos dias. E cada sulco no meu rosto expõe minha fragilidade de não expor em gritos meu sufocado delito, de amar minha viva vida, árvore dorme, pelo descaso da espera, seus galhos choram, suas raízes clamam pela chuvada, advinda pelo vento meridional. O sonho se torna papel, a árvore se derrete, pela generosidade das águas, as lacunas humildes e secas agradecem o doce das águas, por lhe trazer de volta a vida verdejante, assim como eu árida sem sono, atravesso a lama da chuva como se fosse óleo nobre sobre meus pés, saio altiva como um cisne, desço pelas cordas dos meus ferimentos, e danço flutuante, pela chuva da liberdade. Olho para trás e vejo a árvore que chora sorrindo, o sol me beija, os caminhos se abrem como se tivessem sempre a minha espera, estou de volta.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Flamboiã '

Ah! Como eu quero plantar pimenta, colher cravos-da-índia, ter varandas de canela, cadeiras de romãzeiras, imponentes janelas de carvalho com portas de cedro, semear lírios da paz, tocar nas bocas de leões amarelos, andar ferindo o pé na terra fértil, olhar ao longe e ver o vento embalar cachos de ouro finos chamados trigos, amontoar pedras, e cozer o nosso pão, arranjar a mesa com toalha de folhas de bananeiras, enfeitar um vaso com flores de amêndoas, mescladas com o amarelo do açafrão, rodear a mesa com pessoas amadas, e chama-las por seus nomes, e saber que tudo que sempre quis foi vivenciar esse momento. O cheiro das tangerinas e pessegueiros inundam o ar como incenso advindo do pomar. O creme do sorvete no seu sabor preferido, e ouvir ao longe risadas tão familiares como sons de gaitas que tiram notas de lágrimas do meu olhar feliz, em ouvir as fiéis gargalhadas do meu tio Francisco, nosso rosto se ilumina, a íris vira arco-íris, e a tão prometida felicidade abre meu portão feito com ornamentos plantados durante uma longa chuvada, os bambu zinhos verdes claros que disputam a claridade Soberana do céu azulado, inalamos juntos o forte cheiro inebriante de uvas, pois sabemos nesse momento estão sendo libertas pelos vinhateiros, o vinho que levou centenas de anos para encorpar e inundar nosso paladar como tapetes aveludados. Com a alegria do vinho vem a cantiga, o tocar do violão, a dança, para expressar nossa gratidão enquanto houver lua ao 'Antigo" Criador do homem que realizou esse infindável projeto de viver, e com a música de fundo, ouvimos as ondas fiéis e compassadas tamborilar nos rochedos, e iniciamos a caminhada da vida, para sermos anfitriões de mais vida... 




Por :Dora Padã

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Pêlos e Apegos '

Não tenho apego, tenho pêlo, não faço caso da vida, nado com bichos, me escondo na mata, todos os rios e pedras me pertencem, sem apego cavalgo em pêlo, sou bicho do mato, brilho no sol, durmo na sombra da lua, meu chão são estrelas, amo terra e céu, chuva e temporal, meu sangue é quente. Não amo, odeio amores, tenho peito de pedra, coração envenenado, olhos avermelhados, amo a vida, fujo de armadilhas, sou macia tenho pêlo e aconchego, minha vida não morre sou leal animal, amo o vendaval, quando amar serei fatal, herdei o instinto maternal, se amo e sou ferida viro fera, odeio o lamento, amo o canto. Onde me espreguiço, perco o sono, tomo banho de terra, terra que me traz árvores para me abrigar, flores para me encantar, frutos para deliciar minha fome, madeira para derreter o meu frio, sou selvagem dançarina dos lagos, lavo meu pêlo sem apelos, sou bicho amoroso, que ama com garra, não tenho medo, só tenho apego.




Por:Dora Padã
Data:21/09/09

Escrava '

Tenho no meu pescoço as argolas da minha vida, para me manter presa, ereta, nos meus dedos trago o anel de escravidão, na minha decadente demência saio a procura do choro embora desejo o doce, meu paladar o amargo, eu aguardo o bem pelos meus labores árduos mais a vida me joga prantos, lembranças que quero esquecer. A vida me consome o ventre com o fogo, sou cativa, sou escrava do caminhar e do brincar nas brasas, me sentia viva, vibrante, mais quando acordo, as manhãs me fazem cativa, esqueço os sonhos, sou concha valiosa que meu amo não compra, mais continuo escrava. Não tenho pão, o mel cristalizou, meus desejos estão sem engodos, meu cérebro me ludibria. E como balança fraudulenta prestes a me roubar, pesa meus erros com pesos premeditados, me vinga com lembranças esquecidas, e em lágrima pago o alto preço, não sou dona do meu litígio pois estão selados, ouço a voz do cativeiro liberto do coração e como humilde escrava rogo que se faça uso das leis de um bom escravo, não tenho privilégios, mais preciso me acostumar a viver escrava. Será? então não me julgues por amar o seol, me tires as correntes e me faça sua escrava para sempre, meu Amo da vida.






Por:Dora Padã
data:10/07/08

domingo, 8 de janeiro de 2012

Aprender '

Cazuza disse:'Morrer não dói', e eu digo:'o que dói é o partir o ter que ir',mas e se não quero ir até onde consigo chegar?, nos meus céus não há pássaros nem desejo de voar, as pedras se esconderam no caminho, os rios sentiram vergonha de suas curvas e secaram, e eu não sei mais chegar onde desenhei meu mundo, minha bússola perdeu o curso os mapas se enrolaram nas minhas gavetas, não ouso olhar no meu relógio do tempo, meu sorriso foi calado cruelmente pelas teias dos meus erros, meu olhar seco tirou meu toque me fez débil me jogou no lodo, me deixou ferida e trouxe a tona lembranças esquecidas, não relembro o sabor do beijo nem o cheiro de amar os sonhos me fazem viva me levam a me entregar, quase pecar fazem meus pensamentos levitar quase realizar, ah o levitar, que me faz flutuar como uma nave e me tira do lodo, a ansiedade queima meu corpo, toco nas correntes do partir e elas desfazem o meu ódio, me faço ser o que não sou...poderosa, estou blefando, com orgulho retalho meus trapos e minha carne, me preparo para encarar meus momentos congelados e decido aprender com a dor, gestos, olhares, descaso ou generosidade. Vou encantar a morte com meu sorriso mais também vou encantar a outros, voltarei a conhecer cada ruga por nome e se possível for, esquecer seus endereços, vou acariciar minha macia vida, vou aprender com o tempo até ele me ensinar como esquecer as endechas, e me tornar canção, mas em dó maior.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Calmaria

A tempestade veio irada e pronta para me enganar, chegou como chuva mansa e fina foi operando sua força no amago profundo do meu ser frágil, e cheia de planos nos pátios do meu templo tornou cética vulcânica, rasgou a minha história e tentou apagar minha linha de limites.Eu então inaugurei algo novo para mim, descobri então que para vence-la faria seu ataque,e assim trazer para dentro de mim a calmaria...Por assim ser, não odiei meu caminhar mas sofri, conheci e realizei, me dei e recebi,e o meu sacrifício virou oferta perfumada, as cicatrizes se tornaram sulcos profundos e se tornaram convidativas para se semear o futuro, as lágrimas amargas magicamente as fiz adocicadas, me adotei como serva de mim mesma para adquirir humildade e viver na calmaria da tempestade, e assim viver a vida plena como me foi desenhada menos colorida, não posso muda-la, assim meus dias para o amanhã são como o crepitar do fogo na madeira, queimando e tornando cinzas e eu sempre na espreita da calmaria. 
Desafortunada, quem sabe?! 
Desaforada sempre. 
Desafiando os golpes da incerteza e usufruindo à alegria de até mesmo poder sentir os tremores da tempestade.

Sequestro '

Me seqüestra o fôlego,pede resgate pelo meu precioso ar, me fere as entranhas me deixa estranha me leva para as trevas e sopra minha luz, cega os olhos do meu poder, serra meus lábios, enfaixa minha alma, fico sem cor, tenho calor, estou presente, quero vinho, tenho visões mais é efeito da dor ou do licor do ódio ou do amor, o seqüestro me mescla de angústia com libertação, terei vida ou serei morta? Qual será o desfecho? Me preparo para viajem aceito o seqüestro mais tenho esperança, me embalo no profundo me assisto, me desperto perdi o sentido e me afoguei,retornei e dei de mim e me dei conta de quem me seqüestra, me abalo me debato, o seqüestrador me ameaça me fere me humilha e eu nas minhas lembranças...então me deixo levar, mais minhas emoções me arrebatam para risadas de pessoas que amei, chego a respirar e me afundar com o cheiro do mar,e relembro sons,músicas,momentos felizes de ter participado de algo valioso, ímpar do qual não mais se repetirá.Sou privilegiada por ter o prazer de ser seqüestrada com dignidade 'e eis aí a verdadeira vida este é o valor.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Vampira '

Sou elétrica meu sangue é verde cheiro a malva faço maldades, moro nas florestas sombrias adormeço na sombra da lua e me aconchego aos pés de cogumelos meu chiclete é urtiga sugo sangue das clorofilas.Anoiteceu na floresta inicio meu voo é hora de mudar aceitar desafios e me aventurar,voo alto vou às copas das árvores e sugo o seu néctar tomo vinho de uvas verdes até atingir prazer herbal conquisto a paz 'to verdona', me preparo para amar,voo mais alto me banho na chuva prateada renovo minha preguiça me esfrego com musgos meus olhos e eles soltam faíscas como que queimando lenha verde então perfumada de menta minto que sou linda e meus dentes serrilhados,pontiagudos estão pronto para o amor,sou vampira,sou trapezista faço amor de ponta cabeça selvagem, pois sou uma inimiga falsa do dia, estou amando,estou amamentando sou morcega sou vampira de clorofila.

Absinto '

Sou 'absintamente' sugada pelo brilho licoroso e amargo da dor de não poder ter um amor, de ser dependente dessa droga chamada pulsar que me vícia, vem quando não quero me violenta me enche de ódio chega quieta nua sem pudor e sem dor me abraça e me domina soberana me obrigando a esquecer quem eu sou e pra onde vou, dor que me tira da paisagem,de cena e me engana me compra e eu banco o preço absurdo do absinto amargo e venenoso que transforma meus olhos e meus gestos.Meu corpo chora sofre o frio gelado quase mortal pela falta quente e reconfortante do meu sangue azul, fico roxa pelo delírio do seu gosto seco, minha carne inerte quase sem vida se foi,as meninas dos meus olhos não vêem mais, estão opacas pelo vício tão maldito da dor,dor de viver de matar para morrer dor da saudade de recordar quando a vida me aplaudia com sua harpa macia e eu adormecia,sou cruel tempestiva estou sempre viajando no trem sem trilhos da ilusão,ilusão de que um dia eu possa sair de traz do meu absinto e eu mesma faça de mim uma criatura vivente pois quero cantar de novo minha canção.

Por :Dora Padã
data:03/03/09