segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

Presente '

Tiro meu passado do rascunho, e traço o esboço do presente, passado irreal, vivido com lucidez louca, de sugar cada fio do tempo, como se a vida fosse embora, sem acenar-me, no instante que o tempo parasse, e me devorasse como se eu fosse nua de alma, e vazia de emoções, e não estivesse presente,  passado, oh! meu passado, forte e intenso, como o peso das águas, e me afogou em ondas pesadas e acortinadas de um mar invisível, do qual somente eu, eu me afogasse na doçura de momentos cristalizados pelo rascunho da felicidade... O passado levou meus planos, fogo, pensamentos de algo não realizado, e restou fiapos de saudades, meu abismo é meu presente, meu palácio, onde marés de águas empoladas escondem o naufrágio de minha derrota, oh! triste rascunho, agora  amarelados pelos dias e anos, selados nas páginas marcadas da minha vida sem vida, onde minha realidade me dá de presente a saudade de sorrir no presente.






Por:Dora Padã
Data:03/07/11

Moinho '

Saí do vendaval, e me tornei a 'Dama da Triste Figura', meu moinho de vento deixou de tocar, não recebe o vento machucando a água com seu bater condoído, não folga nas alegrias, e se debate na tristeza, o frio vindo do sul sacode seus ossos, e esse guizo fere os ouvidos das árvores, as flores se fecham com medo do olhar dolorido da 'Dama Triste', os rios choram e soluçam com a saudade incontida de que um dia a dama que foi radiante e que era elegante em seus gestos, exalavam o aroma de violetas, que visão triste, sentir e viver e não realizar. Na beira dos rios a orquestra dos insetos bateram em retirada, levando suas notas... Com Dó para alguém que mereça ouvi-las, os limos ficaram impregnados na madeira do carvalho, na espera de que um dia a dama matasse seu dragão, e liberta voltasse a cavalgar o seu negro cavalo, tão corajoso como a dama, e retornasse ao seu moinho de vento. Mas a dama terá de caminhar sobre pedras de fogo, e dar a luz sem dor... Mais no medo há a dor, que mata. Sinto o momento da luta, e o grande dragão volta, sinto seu ar quente sobre mim, volto ao princípio e exijo de mim a luta, visto minha armadura brilhante, em punho a lança, não me permitirei ser covarde, me dou a chance de vencer, o vento me favorece, me energiza, sou guerreira, cavalgo com obstinação e mato meu dragão, saio do vendaval, sou a 'Dama do Moinho'...




Por:Dora Padã
Data:11/01/11

quarta-feira, 25 de janeiro de 2012

Mentiras '

Sinto cheiro de montanha com perfume de montana, no ar flutuam ananás e alfazemas, cheiro repousante da verdade, odor insuportável do mentir. Fui a Roma, odiei catedrais, amei palácios, e me senti soberana, em Paris amei a luz, odiei o gueto, e me vi sem luz, nas areias do deserto mergulhei no Nilo, odiei a Esfinge, mais amei Faraó, não fingi... Me batizei no Mar Morto, me senti viva, e sangrei, viajei, respeitei o tempo, o espaço, a vida me fez mentir para não sentir, sou insípita como os camarins, meus pensamentos insuportáveis estão em artes cênicas, pelo fragrante cheiro da verdade. A verdade corrói e fere, mas como bálsamo, cura, regenera, e volta a vida, nos faz voar com asas 'real' da paz. Voltar a Paris e sentir a luz, mergulhar no bem amar, e flutuar no tempo, e na volta merecer espaços, batizar a felicidade, se achegar, me perfumar, acreditar que o mentir é astúcia, e a verdade é indestrutível e penetrante luz. 
Fui a Paris?







Por:Dora Padã
Data:20/05/11

Árvore que Chora '

Desejei quase que opressivamente partir, me calei, travei, e acomodei, palavras que se tornam vivas, fortes ou fracas? Não soube fingir, me tornei passiva, deslocada e infeliz, vivo sonhos irreais, pesadelos reais, cicatrizes foram curadas com unguento da tristeza e adormecidas pelas promessas vazias, magoada e manchada como nodêna, não parti me escondi em um labirinto sombrio e úmido, de uma casa fantasmagórica, minha mente falha ela se perdeu nas correntes do meu fúnebre relógio, emudecendo o tic-tac do seu cantar. A dança perdeu a leveza meus pés estão dormentes, não acompanham minhas emoções, sou uma árvore que chora, plantada na terra árida da saudade dos meus velhos dias. E cada sulco no meu rosto expõe minha fragilidade de não expor em gritos meu sufocado delito, de amar minha viva vida, árvore dorme, pelo descaso da espera, seus galhos choram, suas raízes clamam pela chuvada, advinda pelo vento meridional. O sonho se torna papel, a árvore se derrete, pela generosidade das águas, as lacunas humildes e secas agradecem o doce das águas, por lhe trazer de volta a vida verdejante, assim como eu árida sem sono, atravesso a lama da chuva como se fosse óleo nobre sobre meus pés, saio altiva como um cisne, desço pelas cordas dos meus ferimentos, e danço flutuante, pela chuva da liberdade. Olho para trás e vejo a árvore que chora sorrindo, o sol me beija, os caminhos se abrem como se tivessem sempre a minha espera, estou de volta.

quarta-feira, 18 de janeiro de 2012

Flamboiã '

Ah! Como eu quero plantar pimenta, colher cravos-da-índia, ter varandas de canela, cadeiras de romãzeiras, imponentes janelas de carvalho com portas de cedro, semear lírios da paz, tocar nas bocas de leões amarelos, andar ferindo o pé na terra fértil, olhar ao longe e ver o vento embalar cachos de ouro finos chamados trigos, amontoar pedras, e cozer o nosso pão, arranjar a mesa com toalha de folhas de bananeiras, enfeitar um vaso com flores de amêndoas, mescladas com o amarelo do açafrão, rodear a mesa com pessoas amadas, e chama-las por seus nomes, e saber que tudo que sempre quis foi vivenciar esse momento. O cheiro das tangerinas e pessegueiros inundam o ar como incenso advindo do pomar. O creme do sorvete no seu sabor preferido, e ouvir ao longe risadas tão familiares como sons de gaitas que tiram notas de lágrimas do meu olhar feliz, em ouvir as fiéis gargalhadas do meu tio Francisco, nosso rosto se ilumina, a íris vira arco-íris, e a tão prometida felicidade abre meu portão feito com ornamentos plantados durante uma longa chuvada, os bambu zinhos verdes claros que disputam a claridade Soberana do céu azulado, inalamos juntos o forte cheiro inebriante de uvas, pois sabemos nesse momento estão sendo libertas pelos vinhateiros, o vinho que levou centenas de anos para encorpar e inundar nosso paladar como tapetes aveludados. Com a alegria do vinho vem a cantiga, o tocar do violão, a dança, para expressar nossa gratidão enquanto houver lua ao 'Antigo" Criador do homem que realizou esse infindável projeto de viver, e com a música de fundo, ouvimos as ondas fiéis e compassadas tamborilar nos rochedos, e iniciamos a caminhada da vida, para sermos anfitriões de mais vida... 




Por :Dora Padã

sexta-feira, 13 de janeiro de 2012

Pêlos e Apegos '

Não tenho apego, tenho pêlo, não faço caso da vida, nado com bichos, me escondo na mata, todos os rios e pedras me pertencem, sem apego cavalgo em pêlo, sou bicho do mato, brilho no sol, durmo na sombra da lua, meu chão são estrelas, amo terra e céu, chuva e temporal, meu sangue é quente. Não amo, odeio amores, tenho peito de pedra, coração envenenado, olhos avermelhados, amo a vida, fujo de armadilhas, sou macia tenho pêlo e aconchego, minha vida não morre sou leal animal, amo o vendaval, quando amar serei fatal, herdei o instinto maternal, se amo e sou ferida viro fera, odeio o lamento, amo o canto. Onde me espreguiço, perco o sono, tomo banho de terra, terra que me traz árvores para me abrigar, flores para me encantar, frutos para deliciar minha fome, madeira para derreter o meu frio, sou selvagem dançarina dos lagos, lavo meu pêlo sem apelos, sou bicho amoroso, que ama com garra, não tenho medo, só tenho apego.




Por:Dora Padã
Data:21/09/09

Escrava '

Tenho no meu pescoço as argolas da minha vida, para me manter presa, ereta, nos meus dedos trago o anel de escravidão, na minha decadente demência saio a procura do choro embora desejo o doce, meu paladar o amargo, eu aguardo o bem pelos meus labores árduos mais a vida me joga prantos, lembranças que quero esquecer. A vida me consome o ventre com o fogo, sou cativa, sou escrava do caminhar e do brincar nas brasas, me sentia viva, vibrante, mais quando acordo, as manhãs me fazem cativa, esqueço os sonhos, sou concha valiosa que meu amo não compra, mais continuo escrava. Não tenho pão, o mel cristalizou, meus desejos estão sem engodos, meu cérebro me ludibria. E como balança fraudulenta prestes a me roubar, pesa meus erros com pesos premeditados, me vinga com lembranças esquecidas, e em lágrima pago o alto preço, não sou dona do meu litígio pois estão selados, ouço a voz do cativeiro liberto do coração e como humilde escrava rogo que se faça uso das leis de um bom escravo, não tenho privilégios, mais preciso me acostumar a viver escrava. Será? então não me julgues por amar o seol, me tires as correntes e me faça sua escrava para sempre, meu Amo da vida.






Por:Dora Padã
data:10/07/08

domingo, 8 de janeiro de 2012

Aprender '

Cazuza disse:'Morrer não dói', e eu digo:'o que dói é o partir o ter que ir',mas e se não quero ir até onde consigo chegar?, nos meus céus não há pássaros nem desejo de voar, as pedras se esconderam no caminho, os rios sentiram vergonha de suas curvas e secaram, e eu não sei mais chegar onde desenhei meu mundo, minha bússola perdeu o curso os mapas se enrolaram nas minhas gavetas, não ouso olhar no meu relógio do tempo, meu sorriso foi calado cruelmente pelas teias dos meus erros, meu olhar seco tirou meu toque me fez débil me jogou no lodo, me deixou ferida e trouxe a tona lembranças esquecidas, não relembro o sabor do beijo nem o cheiro de amar os sonhos me fazem viva me levam a me entregar, quase pecar fazem meus pensamentos levitar quase realizar, ah o levitar, que me faz flutuar como uma nave e me tira do lodo, a ansiedade queima meu corpo, toco nas correntes do partir e elas desfazem o meu ódio, me faço ser o que não sou...poderosa, estou blefando, com orgulho retalho meus trapos e minha carne, me preparo para encarar meus momentos congelados e decido aprender com a dor, gestos, olhares, descaso ou generosidade. Vou encantar a morte com meu sorriso mais também vou encantar a outros, voltarei a conhecer cada ruga por nome e se possível for, esquecer seus endereços, vou acariciar minha macia vida, vou aprender com o tempo até ele me ensinar como esquecer as endechas, e me tornar canção, mas em dó maior.

sábado, 7 de janeiro de 2012

Calmaria

A tempestade veio irada e pronta para me enganar, chegou como chuva mansa e fina foi operando sua força no amago profundo do meu ser frágil, e cheia de planos nos pátios do meu templo tornou cética vulcânica, rasgou a minha história e tentou apagar minha linha de limites.Eu então inaugurei algo novo para mim, descobri então que para vence-la faria seu ataque,e assim trazer para dentro de mim a calmaria...Por assim ser, não odiei meu caminhar mas sofri, conheci e realizei, me dei e recebi,e o meu sacrifício virou oferta perfumada, as cicatrizes se tornaram sulcos profundos e se tornaram convidativas para se semear o futuro, as lágrimas amargas magicamente as fiz adocicadas, me adotei como serva de mim mesma para adquirir humildade e viver na calmaria da tempestade, e assim viver a vida plena como me foi desenhada menos colorida, não posso muda-la, assim meus dias para o amanhã são como o crepitar do fogo na madeira, queimando e tornando cinzas e eu sempre na espreita da calmaria. 
Desafortunada, quem sabe?! 
Desaforada sempre. 
Desafiando os golpes da incerteza e usufruindo à alegria de até mesmo poder sentir os tremores da tempestade.

Sequestro '

Me seqüestra o fôlego,pede resgate pelo meu precioso ar, me fere as entranhas me deixa estranha me leva para as trevas e sopra minha luz, cega os olhos do meu poder, serra meus lábios, enfaixa minha alma, fico sem cor, tenho calor, estou presente, quero vinho, tenho visões mais é efeito da dor ou do licor do ódio ou do amor, o seqüestro me mescla de angústia com libertação, terei vida ou serei morta? Qual será o desfecho? Me preparo para viajem aceito o seqüestro mais tenho esperança, me embalo no profundo me assisto, me desperto perdi o sentido e me afoguei,retornei e dei de mim e me dei conta de quem me seqüestra, me abalo me debato, o seqüestrador me ameaça me fere me humilha e eu nas minhas lembranças...então me deixo levar, mais minhas emoções me arrebatam para risadas de pessoas que amei, chego a respirar e me afundar com o cheiro do mar,e relembro sons,músicas,momentos felizes de ter participado de algo valioso, ímpar do qual não mais se repetirá.Sou privilegiada por ter o prazer de ser seqüestrada com dignidade 'e eis aí a verdadeira vida este é o valor.

quarta-feira, 4 de janeiro de 2012

Vampira '

Sou elétrica meu sangue é verde cheiro a malva faço maldades, moro nas florestas sombrias adormeço na sombra da lua e me aconchego aos pés de cogumelos meu chiclete é urtiga sugo sangue das clorofilas.Anoiteceu na floresta inicio meu voo é hora de mudar aceitar desafios e me aventurar,voo alto vou às copas das árvores e sugo o seu néctar tomo vinho de uvas verdes até atingir prazer herbal conquisto a paz 'to verdona', me preparo para amar,voo mais alto me banho na chuva prateada renovo minha preguiça me esfrego com musgos meus olhos e eles soltam faíscas como que queimando lenha verde então perfumada de menta minto que sou linda e meus dentes serrilhados,pontiagudos estão pronto para o amor,sou vampira,sou trapezista faço amor de ponta cabeça selvagem, pois sou uma inimiga falsa do dia, estou amando,estou amamentando sou morcega sou vampira de clorofila.

Absinto '

Sou 'absintamente' sugada pelo brilho licoroso e amargo da dor de não poder ter um amor, de ser dependente dessa droga chamada pulsar que me vícia, vem quando não quero me violenta me enche de ódio chega quieta nua sem pudor e sem dor me abraça e me domina soberana me obrigando a esquecer quem eu sou e pra onde vou, dor que me tira da paisagem,de cena e me engana me compra e eu banco o preço absurdo do absinto amargo e venenoso que transforma meus olhos e meus gestos.Meu corpo chora sofre o frio gelado quase mortal pela falta quente e reconfortante do meu sangue azul, fico roxa pelo delírio do seu gosto seco, minha carne inerte quase sem vida se foi,as meninas dos meus olhos não vêem mais, estão opacas pelo vício tão maldito da dor,dor de viver de matar para morrer dor da saudade de recordar quando a vida me aplaudia com sua harpa macia e eu adormecia,sou cruel tempestiva estou sempre viajando no trem sem trilhos da ilusão,ilusão de que um dia eu possa sair de traz do meu absinto e eu mesma faça de mim uma criatura vivente pois quero cantar de novo minha canção.

Por :Dora Padã
data:03/03/09